Questão já foi julgada pelo TJSP. Falta apenas iniciativa de Câmara e Prefeitura de Mococa.

O mocoquense convive com um problema que parece ficar cada dia mais irritante: o barulho alto de motocicletas. Atrapalhando estudos, lazer e descanso e possivelmente violando os limites de velocidade, esse problema poderia deixar de existir com uma lei. Mas o município pode criar esse tipo de lei? Segundo o Tribunal de Justiça de São Paulo, sim.
No ano passado, o Órgão Especial do TJSP julgou válida a lei municipal Nº1/2022 de Osvaldo Cruz, município paulista com cerca de 30 mil habitantes, que fica entre Araçatuba e Presidente Prudente. A lei estabelece limites para ruído de escapamento de veículos automotores, fixando multa para o caso de descumprimento. Os limites, na verdade, são de uma norma federal, a Resolução nº 418, de 25 de novembro de 2009, do Conselho Nacional de Meio Ambiente. Para as motocicletas, o limite é de 99 decibéis.
- “Três inconscientes na sala”: terapia de casal não é apenas para casados
- O rosto que provavelmente você já viu
- Stephanie: tanto jardineira quanto arquiteta
Não é inconstitucional lei municipal que coloca limites na poluição sonora
A ação de inconstitucionalidade que pretendia declarar nula a lei contra ruídos foi proposta pela própria prefeitura. O executivo sustentava:
- que apenas a União poderia criar leis sobre trânsito, já que o Código de Trânsito Brasileiro estabelece que ” Art. 22. Compete aos órgãos ou entidades executivos de trânsito dos Estados e do Distrito Federal, no âmbito de sua circunscrição”, dentre outras coisas, ” XV – fiscalizar o nível de emissão de poluentes e ruído produzidos pelos veículos automotores ou pela sua carga, de acordo com o estabelecido no art. 66, além de dar apoio, quando solicitado, às ações específicas dos órgãos ambientais locais”, e a Constituição estabelece que “Art. 22. Compete privativamente à União legislar sobre”, dentre outras coisas, “XI – trânsito e transporte”;
- que a lei ofende Lei Orgânica do Município, a Constituição Estadual e a Constituição Federal, ao criar despesas sem indicar fonte de custeio, já que a Constituição Estadual estabelece que “Artigo 25 – Nenhum projeto de lei que implique a criação ou o aumento de despesa pública será sancionado sem que dele conste a indicação dos recursos disponíveis, próprios para atender aos novos encargos.”, e que é vedado: “ I – o início de programas, projetos e atividades não incluídos na lei orçamentária anual;” (Art.176)
- que a lei ofende o princípio de separação dos poderes, pois apenas o Prefeito poderia propor lei que altera a estrutura administrativa da Prefeitura;
Foi concedida uma liminar, suspendendo os efeitos da norma. No julgamento definitivo, apenas um trecho da foi considerado inconstitucional, isso porque o vereador Luís Ricardo Spada Bonfim (PSDB) não poderia criar obrigação – a obrigação de fiscalizar a emissão dos ruídos – para o poder executivo, o que só pode ser feito pelo Prefeito.
Art. 5º É de responsabilidade do Poder Executivo, através do Departamento Municipal de Trânsito, a fiscalização dos níveis de emissão de ruídos provenientes do escapamento dos veículos automotores em circulação.
Parágrafo único. O Departamento Municipal de Trânsito, através de seus agentes, será o responsável, dentro de suas competências, de fiscalizar e prestar apoio operacional às ações desenvolvidas nas vias e logradouros públicos; em caso de aplicação de multas e apreensão de veículos conforme o Código Brasileiro de Trânsito, podendo solicitar o auxílio da Polícia Militar
Lei Nº1/2022, Osvaldo Cruz (Trecho declarado inconstitucional)
” […] no que diz respeito aos dispositivos retro mencionados, é patente o vício de iniciativa na espécie, já que as normas retro especificadas, ao promoverem aumento de atribuições de órgão público da administração municipal, acabam por interferir diretamente na organização da administração pública, certo que lei dessa natureza é de iniciativa legislativa que compete ao Chefe do Poder Executivo.”
Voto do Desembargador Gastão Toledo de Campos Mello Filho na Adin nº 2040936-67.2022.8.26.0000
O restante do projeto foi dado como constitucional. Sobre a tese de que apenas a União pode criar leis sobre o trânsito, o relator entendeu que o caso não se trata de trânsito, mas de poluição sonora, ou seja, meio ambiente. Foi observado que a lei em questão caminha ao encontro da regulamentação federal sobre o tema, até por utilizar de resolução federal como base.

” […] não há que se falar em invasão da competência privativa da União para legislar. Ao contrário, trata-se de competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, por força do que prevê a norma prevista no art. 23, VI, da Constituição Federal, verbis:
Voto do Desembargador Gastão Toledo de Campos Mello Filho na Adin nº 2040936-67.2022.8.26.0000
Art. 23. É competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios:
(…)
VI – proteger o meio ambiente e combater a poluição em qualquer de suas formas;”
Sobre invadir o espaço de poder do prefeito, o magistrado responde com jurisprudência do STF:
“Não usurpa competência privativa do Chefe do Poder Executivo lei que, embora crie despesa para a Administração, não trata da sua estrutura ou da atribuição de seus órgãos nem do regime jurídico de servidores públicos.”
Tese 917 de Repercussão Geral, Supremo Tribunal Federal.
O desembargador acrescenta que “a ausência de dotação orçamentária para custeio de despesa não tem sido entendida por esta Corte como vício que implique inconstitucionalidade, mas fato que acarreta, quando muito, a ineficácia da norma”.
A decisão do TJSP cria precedente. Isso significa que o município de Mococa e qualquer outro – especialmente se for do estado de São Paulo – pode aproveitá-la para criar suas próprias leis anti-ruído sem medo de uma derrubada na justiça.
Deixe um comentário