Nem mesmo órgãos que lidam com grandes volumes de dados de cidadãos, como o Ministério da Saúde, usaram tanto a LGPD para cercear direito à informação

Dados do site Transparência Brasil
Enquanto estouravam as revelações dos irmãos Miranda na CNN Brasil e, posteriormente, na CPI da COVID-19 no Senado, um cidadão qualquer – possivelmente jornalista – solicitou as datas e horários dos registros de entrada e saída do Deputado Federal Luís Miranda (DEM-DF) no Palácio do Planalto. Acesso negado: assim como o pedido que queria saber quando representantes da Apsen Farmacêutica estiveram com o presidente da república, o Gabinete de Segurança Institucional, chefiado pelo general Augusto Heleno, alegou que o acesso a tais informações colocaria em risco a segurança do presidente da república ou de seus colaterais.
É esse o costume, ao menos desde 2020. O GSI é o órgão do governo federal que mais utiliza a Lei Geral de Proteção de Dados como justificativa para negar o acesso a informações através do sistema que da corpo à Lei de Acesso à Informação. Para termos uma base numérica, as negativas que usaram a LGPD em seu texto eram 11,3% do total em 2020, e em 2021 já alcançam 51,2%.
Veja um exemplo:
“[…] esclarecemos que, considerando a Lei Nº 13.709, de 14 de agosto de 2018, a qual entrou em vigor em 14 de agosto de 2020, a solicitação não poderá ser atendida, conforme o que reza a referida lei em seus artigos 6º e 7º transcritos a seguir:
Art. 6º As atividades de tratamento de dados pessoais deverão observar a boa-fé e os seguintes princípios:
I – finalidade: realização do tratamento para propósitos legítimos, específicos, explícitos e informados ao titular, sem possibilidade de tratamento posterior de forma incompatível com essas finalidades; …
Art. 7º O tratamento de dados pessoais somente poderá ser realizado nas seguintes hipóteses:
I – mediante o fornecimento de consentimento pelo titular;
II – para o cumprimento de obrigação legal ou regulatória pelo controlador;
VII – para a proteção da vida ou da incolumidade física do titular ou de terceiro;
Observa-se, assim, que o tratamento de dados pessoais coletados no caso, o nome e a data de entrada de visitantes que se cadastram para encontrar o Presidente cumpre a finalidade específica de segurança da mais alta autoridade do Poder Executivo do País, amparada na Lei nº 13.844, de 18 de junho de 2019, que dispõe o seguinte:
Art. 10. Ao Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República compete: …
VI – zelar, assegurado o exercício do poder de polícia:
a) pela segurança pessoal:
1. do Presidente da República e do Vice-Presidente da República;
2. dos familiares do Presidente da República e do Vice-Presidente da República;
e 3. dos titulares dos órgãos de que trata o caput do art. 2º desta Lei e, excepcionalmente, de outras autoridades federais, quando determinado pelo Presidente da República;
e b) pela segurança dos palácios presidenciais e das residências do Presidente da República e do Vice-Presidente da República;
Do exposto, fica clara a impossibilidade do fornecimento dos dados pessoais solicitados para outros fins que não a segurança do Presidente da República. “
Em contraste, o Ministério da Defesa tem usado menos a LGPD como desculpa: sua menção no corpo das negativas passaram de 12,5% em 2020 para 7,1% em 2021. Ainda sim, são notórios casos como o de quando o comando do exército negou “acesso à lista dos servidores militares desta força que recebem, atualmente, o “adicional de habilitação”.
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