Impactos da COVID na saúde mental provavelmente não irão embora junto com o isolamento.

Pacientes que, já podendo recorrer à terapia presencial, optam por continuar o tratamento através da internet, em isolamento, talvez por “medo de voltar ao mundo real” e por um costume com maneiras de interagir não-presenciais. O relato é da psicóloga Sabrina FrançaCRP 05/61974, e é um exemplo do que diz um artigo publicado na revista Nature no último domingo (26), onde um grupo de 9 especialistas afirma que “se uma ação urgente e eficaz não for tomada, a escala prolongada e global da interrupção da pandemia lançará uma longa sombra sobre a saúde mental, particularmente a dos jovens”.
O texto analisa a necessidade de prevenção contra uma substancial alta nos casos de doenças mentais no pós-pandemia, advogando pelo olhar econômico e social para esse problema. É criticado o foco dado exclusivamente nos “programas de educação em saúde mental, linhas de ajuda para crises, melhor acesso a serviços virtuais e ajustes nos arranjos existentes para melhorar o acesso ao atendimento de emergência”.
Sabrina França alerta para o cuidado em olhar para a dependência entre os fatores: acredita que tanto a economia interfere na saúde mental quanto o contrário, não sendo possível deixar de lado os cuidados mais básicos para reduzir a “longa sombra” dos impactos psíquicos. A psiquiatra Priscila Zempulski DossiCRM-MS: 7271 RQE: 5944/5945 entende que a “longa sombra” não se dará devido a aumento ou piora, mas a um momento em que os problemas virão mais à tona.
A Organização Mundial da Saúde afirma que os programas de promoção de saúde mental foram os mais gravemente impactados pelo novo normal. Para além da dimensão externa, a psicóloga Jésica LimaCRP 05/61835 acredita que o futuro da saúde mental dependerá de como cada família irá ressignificar os novos desafios. Não apenas o econômico e social deve ser pensado, mas uma abordagem multidisciplinar, com intervenções em “todos os contextos”, conclui.
Dados coletados no Japão indicam que houve aumento de 16% na taxa de suicídio durante a pandemia, metade dos casos ocorridos entre crianças e adolescentes. A previsão do estudo é de que os impactos da COVID na saúde mental se estendam no longo prazo. A Organização Pan-Americana da Saúde informou, no mês passado, que 60% da população de todo o continente americano sofre de ansiedade ou depressão. Aqui no Brasil, a experiência clínica confirma os estudos: psicólogas relatam aumento na demanda, especialmente em casos de ansiedade e depressão, mas também compulsões, insônia, estresse e baixa auto-estima.
Sabrina França acredita na eficiência limitada do online, tanto que não atende crianças desta maneira, por não acreditar na eficácia da modalidade nesta faixa etária. Apesar de atender à distância, até mesmo pelo benefício de chegar a pessoas de outras cidades, no presencial, afirma, é possível analisar de maneira mais completa os gestos, olhares e demais minucias que passariam desapercebidas nas telas.
“Na primeira sessão ele tá nervoso, passa a mão na poltrona… já na sessão seguinte ele cruza até as pernas pra falar com você, a gente vê que ele tá mais relaxado, houve uma troca ali, ele está se sentindo relaxado na minha presença. Tudo isso conta como terapia.”
(Sabrina França)
A psicóloga Laila Fernandes CRP 05/55390 aponta para a toxicidade da internet, que segundo ela promove constantemente a comparação com vidas consideradas superiores, além do impacto na qualidade do sono, dentre outros fatores. A juventude agrava a situação pela natural prevalência de inseguranças e incertezas desse grupo que está em desenvolvimento. Para Laila, tudo começa por saber identificar essas emoções, para que então seja possível administrá-las.
Apesar da previsão, é consenso que as projeções acerca da saúde mental são precárias, pois baseiam-se em fatores de risco observados no passado, não levando em conta as interações entre indivíduo e ambiente.
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